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Especial – Migrações partidárias

Em artigo publicado na revista acadêmica Argumentos, da Universidade Unimontes, editor do Portal de Notícias do Parlamento goiano disseca a relação Executivo-Legislativo nas últimas legislaturas na Alego.

Como funcionam as coalizões de governo, as bancadas de oposição e as migrações partidárias no Estado de Goiás, para identificar padrões de oposição e de apoio dos deputados estaduais ao governador e a influência no fator governabilidade. É o que investiga a dissertação de mestrado de Cezar Santos, aprovada em maio de 2023, no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP) da Universidade Federal de Goiás (UFG), sob orientação do professor doutor Robert Bonifácio.

A dissertação é matriz de artigo assinado por Cezar Santos, publicado na revista Argumentos (volume 21, nº 2), da Universidade de Montes Claros (MG), em coautoria com o orientador (https://www.periodicos.unimontes.br/index.php/argumentos/index).

Trata-se de uma das mais destacadas publicações acadêmicas de ciência sociais do País. No trabalho, o jornalista, que é editor do Portal de Notícias da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), analisa a relação Executivo-Legislativo em Goiás nas últimas legislaturas no Parlamento goiano. 

O período abarcado é de 2019 a 2023 (19ª legislatura), com ligeira leitura das três legislaturas anteriores para colher subsídios comparativos. Foram identificados os deputados de oposição que migraram (eleitos por partidos que disputaram o turno final contra a coalizão vencedora) para o governismo, utilizando-se de análise longitudinal e descritiva.

No plano conceitual e teórico, são discutidas coalizões, governabilidade e relação Executivo-Legislativo. Identifica-se que os níveis de apoio parlamentar às proposições do Executivo são bem semelhantes entre oposicionistas e governistas. O estudo alarga conhecimentos sobre a dinâmica governismo-oposição em contexto subnacional e ajuda a compreender o processo político em Goiás nos últimos 20 anos.

Fenômeno corriqueiro

O pesquisador coloca que a migração de parlamentares eleitos pela oposição para o governismo, no meio do mandato, é um fenômeno corriqueiro, o que é sempre intrigante do ponto de vista político e ensejou a proposta da dissertação. Na introdução ele pergunta: “Muda o governo ou muda o deputado? O parlamentar escalado para ser oposição e que troca de lado ‘trai’ seu eleitor?”, lembrando que o tema é objeto de vários estudos na ciência política.

Cezar Santos anota que, na agenda da ciência política e no jornalismo político em específico, está estabelecido que mudanças partidárias por parte de parlamentares são estimuladas pelos governantes, para reforçar a sua base. É resultado direto do chamado “presidencialismo de coalizão”, expressão consagrada pelo cientista político Sérgio Abranches em 1988.

“A busca para formar coalização de governo e ampliar maioria no Parlamento é fato, também, ao nível subnacional (estados e municípios). O ‘adesismo’ é comum nos parlamentos brasileiros e esse artigo tem por finalidade contribuir para o melhor entendimento do fenômeno, a partir de estudo do contexto goiano”, assinala Santos.

O pesquisador anota que a mesma lógica do “presidencialismo de coalizão” se aplica no nível subnacional, ou seja, estados e municípios. No federalismo brasileiro, os governadores precisam de mais de 50% dos deputados estaduais para aprovarem projetos de lei ou a previsão orçamentária e o orçamento propriamente dito do Estado, compreendido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA)”, aponta. “No caso de proposta de emenda à Constituição (PEC), são necessários 60% (três quintos) das cadeiras. Em Goiás, em termos práticos, uma bancada governista só se configura como efetivamente majoritária se tiver pelo menos 25 do total dos 41 deputados”, ou seja, com número mínimo suficiente para aprovar emendas constitucionais.

“Sem maioria, ou com maioria no limite mínimo, é natural que o governador busque atrair eleitos que foram adversários na campanha, aqueles que eventualmente se posicionam como independentes para sua base na Casa Legislativa”, analisa Santos.

Em Goiás

Na eleição de 2006 (16ª Legislatura), a aliança derrotada “Goiás Melhor para Todos” (PMDB-PDT-PSC-PTC-Prona) elegeu 13 parlamentares (32%). “Não houve, a rigor, migração de oposicionistas para a situação, o que se explica pelo fato de que o Executivo vinha de duas gestões seguidas comandadas pelo PSDB, avalizador da eleição de Alcides Rodrigues, então no PP, para a terceira gestão do mesmo grupo”, anota o pesquisador.

A configuração político-partidária estava bem sedimentada, tanto na situação, com base tucana fortemente solidificada no Parlamento, quanto na oposição, esta liderada pelo PMDB, cujos parlamentares se viam na obrigação de sustentar o discurso de embate para se fixar como possibilidade de alternância para o eleitor na próxima eleição.

Já na eleição de 2010 (17ª Legislatura), a aliança derrotada “Goiás Rumo ao Futuro” (PMDB-PT-PCdoB) elegeu 12 parlamentares (29%). Ainda sob marcado antagonismo político-ideológico dos grupos marconista e antimarconista, houve apenas um migrante da oposição para o governismo. 

Na eleição de 2014 (18ª Legislatura), a aliança derrotada “Amor por Goiás” (PMDB-SD-DEM-PC do B-PPL-PRTB-PTN) elegeu nove parlamentares (22%). O PMDB, maior legenda da oposição ao PSDB, perdeu três deputados em relação à legislatura anterior. Três parlamentares eleitos pela oposição “viraram a casaca”. 

Na eleição de 2018, que formou a 19ª Legislatura, foco principal do estudo, destoa das três anteriores, porque foi definida no primeiro turno com a vitória de Caiado (então no DEM e que depois, em fusão com o PSL, tornou-se União Brasil).

Os deputados de oposição para a contagem de migrantes que rumaram ao governismo são os eleitos na chapa do partido que estava no poder e que foi derrotada, a “Goiás Avança Mais”, capitaneada pelo PSDB, com mais dez partidos (PTB-PSB-PR-PSD-PPS-SD-PV-Avante-Patri-Rede) e que elegeu 14 parlamentares (34%). Nessa legislatura ocorreu uma mudança no estamento político-partidário em Goiás, reflexo da troca de comando no Executivo, que passou de sucessivos governos tucanos para uma nova situação, o DEM (agora UB) de Caiado.

O resultado, registra Cezar Santos, foi o maior volume de corrida rumo ao governismo entre as quatro legislaturas analisadas, nada menos que 11 (27% do total de deputados, ou quase um terço) ou até 12, se incluir um deputado do DC. Todos os migrantes receberam os benefícios governamentais de praxe oferecidos aos aliados. Com a vitória de Caiado desenhada na campanha em 2018, as defecções ao principal opositor, o PSDB marconista, começaram imediatamente depois da eleição.

Dominância do Executivo

As razões da maior migração de oposicionistas para o governo na 19ª Legislatura estão explanadas ao longo do artigo, consoante a literatura consagrada na ciência política. O pesquisador escreve que a construção da maioria parlamentar possibilitou que o Governo aprovasse, com tranquilidade, todos os seus projetos, mesmo aqueles que implicaram certo desgaste com a opinião pública. “A oposição parlamentar, mesmo minoritária, manobrou no espaço institucional possível e, sob a inequívoca dominância do Executivo, fez o que podia: barulho na tribuna e na imprensa, conseguindo, em alguns momentos, mobilizar grupos de pressão como sindicatos e associações de classe”, pontua o pesquisador.

Cezar Santos contabiliza que a base aliada ficou com 27 deputados, ou seja, crescimento de 22% em relação ao resultado das urnas, superando os três quintos do total, que seriam 25, o número “mágico” que permite ao governo aprovar emendas à Constituição, conforme determina o Regimento Interno da Alego (artigo 191).

A oposição se reaglutinou na nova configuração partidária, em número de 14 parlamentares (34% do total), em cinco siglas. “Se é fato que Caiado saiu da eleição de 2018 com base parlamentar numericamente desfavorável (…), o que se constatou é que ele soube operar com eficiência para reverter a desvantagem e garantir a governabilidade, cooptando parlamentares da oposição”, escreve Santos.

Votações

O pesquisador mostra em gráficos detalhados, ano a ano, as médias de SIM aos projetos apresentados pelo Governo tanto dos deputados “vira-casacas” quantos dos “fiéis” ao Palácio das Esmeraldas. A pesquisa certifica que, ao longo do tempo, a média não muda de forma significativa, ou seja, adesistas e fiéis tendem a votar de forma parecida. Quanto à oposição, mesmo votando contra os principais projetos governamentais, não teve peso para derrubar nenhuma das propostas palacianas.  

O pesquisador conclui que os índices mostram que a base aliada constituída ficou muito coesa durante toda a 19ª Legislatura. “Ronaldo Caiado exerceu sua influência com desassombro e garantiu a governabilidade em seu primeiro mandato em Goiás. Resultado semelhante foi obtido pelos governadores nas três legislaturas anteriores, em graus diferentes conforme a situação político-partidária que estava estabelecida em cada momento”, começa Santos na conclusão de seu estudo.

“Caiado entrou no segundo ano de mandato com uma base parlamentar de apenas 23 deputados (margem majoritária de risco), o que dificultou a aprovação de algumas matérias de interesse do governo (…) A configuração final das bancadas de situação (27) e de oposição (14) prova que o governador fez o trabalho de cooptação necessário para assegurar a governabilidade de sua primeira gestão”, completa.

Em seu estudo, o jornalista e mestre em ciência política “antecipa” o cenário que se apresentava para a 20ª Legislatura. Ele anota que, em tese, em termos puramente numéricos, significa que Caiado nem precisaria de mais aliados para sacramentar sua maioria parlamentar. “O fato é que, já no anúncio do resultado das urnas, eleitos por outros partidos sinalizaram adesão ao projeto caiadista, o que já consolidou, de saída, bancada governista com mais de 30 parlamentares”, analisa.

Pela lógica política, conforme descrita ao longo do artigo, a previsão é que o governador, sem precisar dispender maiores recursos e energia no convencimento de opositores, teria ainda mais tranquilidade na aprovação de seus projetos durante a 20ª Legislatura, iniciada em 1º de fevereiro de 2023 e com término em 31 de janeiro de 2027. Segundo o pesquisador, os números permitiriam antecipar que a segunda gestão de Ronaldo Caiado será, mais uma vez, de “pacto homologatório” entre o Palácio das Esmeraldas e o Palácio Maguito Vilela, sede do Parlamento estadual.

Fonte:Agência Assembleia de Notícias

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