A data é lembrada desde 1985, com o objetivo de alertar sobre os males provocados pelo excesso do consumo da carne, além da preocupação com o bem-estar dos animais e o equilíbrio ambiental.
Ontem dia 20 de março, foi celebrado o Dia Mundial Sem Carne. A data alerta para problemas relacionados a excessos na produção e consumo do alimento. As consequências para a saúde humana, para o bem-estar dos animais e para o equilíbrio ambiental são os principais focos da campanha.
O movimento surge na agenda global em 1985, sendo puxado por adeptos e defensores do vegetarianismo e do veganismo nos Estados Unidos. A iniciativa partiu da ONG Farm (da sigla em inglês: Farm Animal Rights Movement), que milita na defesa dos direitos dos animais.
A princípio minoritário, o estilo de vida baseados em filosofias que rejeitam ou evitam o consumo de carne vem ganhando cada vez mais adeptos ao redor do mundo. No Brasil, o grupo dos autodeclarados vegetarianos reunia, em 2018, segundo o IBOPE, um total de 30 milhões de brasileiros. Um contingente que já alcançava, portanto, 14% da população nacional.
Pesquisa anterior, de 2012, mostrava o crescimento dos adeptos da dieta alimentar, que é reconhecida por excluir do cardápio produtos de origem animal, como ovos, leites e derivados. Nas regiões metropolitanas, o aumento chegava a ser da ordem de 75%.
Para os veganos, a estimativa da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB) é a de que o grupo contava, em 2018, com cerca de 7 milhões de adeptos no país. Vale destacar que o movimento amplia práticas adotadas pelos vegetarianos, refletindo um estilo de vida onde seus praticantes buscam excluir todas as formas de exploração e crueldade contra os animais. Isso se dá não apenas na escolha da alimentação, mas também do vestuário e de outras esferas do consumo, como o de produtos de limpeza e cosméticos.
A SVB destaca, ainda, dados de outra pesquisa, realizada em 2020, a pedido da Ingredion – empresa dos EUA que atua no ramo de processamento e refino de alimentos, aditivos e açúcares à base de milho. Os resultados revelaram forte inclinação para um aumento ainda mais significativo do vegetarianismo no Brasil, com cerca de 90% dos brasileiros percebendo os produtos de origem vegetal como principal fonte nutricional para o alcance de uma alimentação saudável.
“É o maior índice entre os cinco países pesquisados, cuja lista é formada por Brasil, Argentina, Chile, Colômbia e Peru. De maneira geral, o público tem uma predisposição relevante a consumir menos carne. Duas em cada três pessoas ouvidas pelos pesquisadores estariam dispostas a reduzir esse consumo. Há ainda a busca por hábitos saudáveis, com o consumo de mais água, frutas e verduras, com redução da quantidade de açúcar na dieta”, arremata a entidade.
Seja por saúde, por compaixão aos animais, por simples gosto ou por respeito ao meio ambiente, os números mostram que, em alguma medida, as iniciativas de conscientização e também a divulgação de novas informações sobre o tema vêm produzindo mudanças importantes na sociedade. Embora a luta contra os excessos da indústria agropecuária continue em alta, o sucesso da campanha presente na data de hoje vem se revelando, em termos de mercado, cada dia mais real e irreversível.
Ainda que pesquisas apontem a saúde como a maior motivação por trás da mudança nos hábitos alimentares, a intensificação da divulgação de informações seguras sobre os danos ambientais causados pela produção e consumo excessivos de carne também deve ser levada em consideração para o alcance das mudanças observadas.
Danos ambientais no radar
Entre os prejuízos ambientais, a principal preocupação é com a produção do metano decorrente das atividades pecuárias. O Brasil é hoje responsável por cerca de 30% da emissão desse gás no mundo. Fruto da digestão dos animais, principalmente dos bovinos, o elemento é considerado o principal vilão do aquecimento global.
Outro problema diz respeito ao excesso de água doce usado para a produção agropecuária, que concentra quase 80% do consumo do recurso no Brasil. Somente a quantidade destinada ao abastecimento animal, que é de cerca de 10% do total, já é considerada, atualmente, maior que a destinada ao abastecimento humano, nas mais de cinco mil cidades brasileiras.
Para uma população hoje estimada em quase 208 milhões de pessoas, existem no Brasil cerca de 220 milhões de bovinos, além de uma quantidade imensa de porcos, frangos e galinhas, que precisam de água para beber. Por essa razão, a diminuição da demanda por carne e outros produtos de origem animal é considerada crucial para o combate à escassez hídrica.
“Segunda sem carne”
Esse é o nome da campanha que vem sendo realizada pela SVB, no Brasil, desde 2009. Presente em mais de 40 países, o movimento visa promover a conscientização sobre os impactos que uma dieta unicamente voltada ao consumo de produtos de origem animal gera para os animais, a sociedade, a saúde humana e o planeta. Com isso, convida a população desses locais a substituir a proteína animal pela vegetal ao menos uma vez por semana.
O movimento acaba abarcando, assim, pessoas que se incluem no grupo dos chamados flexitarianos. Tratam-se daqueles que têm a intenção de reduzir o consumo de proteína animal, mas não a tiram totalmente do seu dia a dia. Atualmente, estes representam quase um quarto da população mundial, sendo 23% em 2021.
Ainda em 2021, pesquisa feita pelo Ipec e encomendada pela SVB apontou que 46% dos brasileiros deixaram de comer carne por vontade própria ao menos uma vez na semana. O número é bastante próximo do estudo, de 2020, divulgado pelo The Good Food Institute (GFI), que mostrou que 49% dos brasileiros já estavam reduzindo esse consumo de alguma forma.
Corroboram, ainda, com o tema, outra série de pesquisas divulgadas pelo IPC Maps, revelando que, nos últimos anos, o consumo de verduras e legumes pelos brasileiros sofreu algumas variações, tendo aumentado de R$ 16,9 bilhões em 2017 para R$ 17,7 bilhões em 2021. O consumo de frutas também vem crescendo, passando de R$ 22,3 bilhões em 2017 para o recorde de R$ 25,4 bilhões em 2021.
Os dados apontam um rico cenário para o crescimento de outros estilos alimentares, como o crudivorismo e o frugivorismo, por exemplo. Também conhecido como alimentação viva (em inglês “Raw Food”), o crudivorismo é um conceito que prioriza os alimentos de forma crua e da maneira mais natural possível. Já o frugivorismo é uma doutrina alimentar em que se ingere apenas frutas, verduras e legumes, estejam crus ou cozidos, e também de forma industrializada.
Outro estilo que tem crescido é o chamado plant based, que está fundamentado na adoção de uma alimentação 100% saudável. Isso significa que ela exclui, completamente, do cardápio produtos industrializados, dando preferência apenas às opções efetivamente naturais e aos alimentos que a terra oferece.
Seja qual for o estilo escolhido, um importante cuidado deve ser aqui observado, que é a preocupação com a devida ingestão de proteínas. Bastante conhecidas por estarem presentes na composição de carnes, ovos e lácteos, esses macronutrientes também podem ser encontrados em diversos alimentos de origem vegetal. Um grupo de destaque são os das chamadas leguminosas, que, no Brasil, tem como principal referência os diversos tipos de feijão. Lentilhas, grão de bico e ervilhas também fazem parte do conjunto. No site da SVB, os interessados podem encontrar uma variedade de receitas com esses ingredientes.
A entidade assegura alguns importantes benefícios da dieta. Em termos de saúde, são listados: a redução do risco de diabetes, o auxílio no controle do peso, a diminuição do risco de infarto e outras doenças cardiovasculares, além da redução do risco de alguns tipos de câncer, como o de intestino grosso. Segundo a SVB, a cada 100 gramas de carne ingerida por dia, o risco, para este último caso, sobe em 19%.
Discussões na Alego
Um destaque na presente discussão é a Lei Estadual nº 21.354 (originalmente projeto de lei 1522/19), de autoria do presidente da Alego, deputado Bruno Peixoto (UB). Já sancionada pelo governador Ronaldo Caiado (UB), a matéria institui a Semana Estadual de Conscientização da Alimentação Saudável, a ser realizada, anualmente, nas proximidades do dia 16 de outubro, data em que é celebrado o Dia Mundial da Alimentação.
Outro projeto em tramitação, que contribui diretamente com o assunto, é o que propõe a implantação de uma política estadual de incentivo às feiras de produtos veganos e vegetarianos em Goiás. Assinada por Lêda Borges (PSDB), a matéria aguarda votação em segunda fase pelo Plenário da Casa.
Em justificativa, a ex-deputada da Alego, que hoje ocupa cadeira na Câmara Federal, traz argumentos que fazem coro aos dados apresentados sobre aumento da busca por qualidade de vida através de uma alimentação mais saudável. Neste sentido, destaca preocupação com os prejuízos à saúde acarretados pelo consumo de alimentos cultivados com agrotóxicos ou outros produtos químicos.
Argumenta também que o mercado de produtos veganos atinge uma parcela crescente da população que busca reduzir o consumo de carnes, leite/derivados e ovos, incluindo aqueles com algum grau de intolerância à lactose, que já atinge 70% dos adultos brasileiros. Segundo Lêda, a realização de feiras de produtos veganos e vegetarianos pode trazer, ainda, ao Estado de Goiás, um círculo virtuoso, na medida em que aumenta a demanda e o estímulo à produção, resultando em mais emprego e renda à população.
Outra iniciativa em tramitação que corrobora com a discussão é o projeto de Karlos Cabral (PSB) sobre cadastro de obesidade infanto juvenil nas escolas da rede estadual. O objetivo é realizar uma triagem daqueles que apresentam desvios nutricionais e/ou risco para doenças crônicas não transmissíveis. Com isso, as escolas podem encaminhar os alunos para o devido tratamento.
A matéria foi recentemente aprovada em segunda fase e aguarda, agora, a apreciação do Executivo. Mauro Rubem (PT) fez a defesa da pauta, ressaltando as consequências quanto à oferta de alimentos de má qualidade e reforçando a importância da reforma agrária. “A produção com agrotóxicos e transgênicos, o monopólio das sementes pelas grandes empresas, são assuntos diretamente relacionados ao projeto, que têm tudo a ver com a reforma agrária e as formas de uso da terra”, iniciou.
O parlamentar seguiu defendendo investimentos em modelos orientados para a produção orgânica e de base familiar. “Esse tipo de produção é plenamente possível. É uma distorção acreditar no contrário, até mesmo porque grandes produtores comem dos pequenos que plantam”, argumentou.Agência Assembleia de Notícias